São Silvestre e Santo André: O Fim e o Início do Calendário Litúrgico Tradicional

Fonte: New Liturgical Movement

Artigo do Dr. Peter Kwasniewski:

Como qualquer pessoa que já tenha usado um missal de altar ou um missal de mão sabe, o Missale Romanum tradicional está organizado em diferentes seções: o ciclo Temporal, que começa no primeiro domingo do Advento e culmina no último domingo depois de Pentecostes; o ciclo Santoral, que começa com a Vigília de Santo André (se se utiliza a edição pré-1955) ou a comemoração de São Saturnino acompanhada imediatamente da festa de Santo André (se se segue a edição de 1962) e termina com o Abade São Silvestre Gozzolino em 26 de novembro; os Comuns, que começam com as Vigílias dos Apóstolos (pré-1955) ou dos Papas (pós-1955) e terminam com a Bem-aventurada Virgem Maria; as Missas votivas; e por fim, diversas orações, a Missa dos Defuntos e Missas locais.

Embora os missais nem sempre tenham sido organizados assim, é evidente que o ciclo Temporal, tal como existe há bastante tempo, faz todo sentido: dizemos que o ano litúrgico da Igreja começa com a estação do Advento e termina com o último domingo depois de Pentecostes. Mas, tomando Santo André como o início oficial do ciclo Santoral e o Abade São Silvestre como o seu término oficial, podemos discernir uma conveniência semelhante na forma como esse ciclo é apresentado no Missale Romanum?

Antes de prosseguir, gostaria de fazer duas qualificações. Primeiro, o Abade São Silvestre Gozzolino, O.S.B. (1177–1267), fundador dos “Silvestrinos”, é uma adição relativamente tardia ao Calendário Geral, tendo sido introduzido pelo Papa Leão XIII em 1890. Como resultado, ele não se encontra nos calendários de algumas dioceses e de certo número de ordens religiosas. Contudo, para a grande maioria dos católicos que celebram com o usus antiquior, o último santo do Santoral é, de fato, o Abade São Silvestre.

Segundo, embora os comentaristas medievais da Escritura (como Guilherme Durando) digam muito pouco sobre a relação entre os ciclos Temporal e Santoral, e embora muitos detalhes resultem inicialmente do acaso ou da praticidade, sabemos, contudo, que a liturgia, ao desenvolver-se organicamente sob o cuidado da Divina Providência, frequentemente exibe uma notável harmonia na ordenação ou disposição de suas partes que ultrapassa muito o escopo limitado das intenções humanas. É por isso que podemos dirigir a questão da conveniência simbólica a qualquer aspecto da liturgia e esperar encontrar respostas plausíveis, assim como os alegoristas medievais conseguiam olhar para as ações cerimoniais — o beijo do altar, o giro do sacerdote, os sinais da cruz — e ver nelas representações de fases da vida de Cristo ou de Sua amarga Paixão. Assim, há toda razão para oferecermos uma explicação simbólica de por que o Santoral tradicional começa e termina como começa e termina.

Comecemos pelo final. Como explica o meu St. Andrew Daily Missal, São Silvestre “devia sua vocação religiosa à visão do cadáver de um parente. Ele viveu primeiro uma vida solitária, mas depois fundou um mosteiro sob a Regra de São Bento.” A história ligeiramente macabra de sua “conversão”, no sentido antigo do termo, é, de fato, tematizada na Coleta da festa:

Ó Deus misericordiosíssimo, que, quando o santo abade Silvestre, junto a uma sepultura aberta, estava meditando sobre a vacuidade das coisas do mundo, dignaste chamá-lo ao deserto e enobrecê-lo com o mérito de uma vida singularmente santa: humildemente Te pedimos que, como ele, desprezemos as coisas terrenas e gosemos para sempre da Tua companhia. Por Nosso Senhor.

Não nos surpreende encontrar o tema de “desprezar as coisas terrenas” em nossa busca pelo unum necessarium, já que é uma característica definidora da espiritualidade da liturgia tradicional. Encontramo-lo presente, por exemplo, no poderoso Secreta do Último Domingo depois de Pentecostes, que diz, em parte: “…volta para Ti os corações de todos nós, para que, libertos das cobiças terrenas, passemos aos desejos celestes.” Contudo, a Coleta de São Silvestre adquire uma adequação peculiar por cair justamente na estação do outono. Pelo menos nos climas do hemisfério norte, o fim do ano litúrgico coincide com o tempo em que o mundo natural escurece e adormece. A vegetação perdeu muito de seu verde, como se a “verdura” da estação de Pentecostes tivesse finalmente desaparecido pela distância de sua origem (“quando o Filho do Homem voltar, encontrará fé sobre a terra?”); as folhas amarelaram e caíram ao chão como tantos corpos de seres mortais prontos para corromper-se em seus túmulos. Notável por suas associações melancólicas, o outono é a estação natural do desapego e da preparação para o longo inverno que precede a estação pascal da primavera e seu análogo sobrenatural da ressurreição. De fato, o mês de novembro é observado como o mês dos mortos, e devemos ver nisso não uma simples associação acidental com Todos os Santos.

O Santoral tradicional, na verdade, parece concentrar nossa atenção no que poderíamos chamar de “escatologia pessoal”: cada um de nós deve estar vigilante, sóbrio, pronto para a vinda de Cristo nosso Juiz. A nota escatológica do fim do ano era fornecida pelos Evangelhos das festas de Santa Cecília em 22 de novembro (Mateus 25, 1–13, as virgens prudentes e imprudentes) e de São Clemente Papa em 23 de novembro (Mateus 24, 42–47: “vigiai, porque não sabeis a hora…”). O primeiro Evangelho era então repetido em 25 de novembro, quando a festa de Santa Catarina se difundiu no Ocidente depois do século XI. Somemos a isso a intensidade das orações designadas para São João da Cruz em 24 de novembro (não em 14 de dezembro como no missal paulino) e vê-se um tema crescente de mortificação tendo em vista nossa mortalidade pecadora e nossa desejada imortalidade.

Em vez de envolver o fim do ano litúrgico no triunfalismo outro-mundano e teilhardiano de “Cristo Rei do Universo”, a festa de São Silvestre em 26 de novembro confere a este ponto uma nota mais sóbria, introspectiva e retrospectiva, como um memento mori: olha para o cadáver na sepultura aberta e vê ali o teu próprio fim; medita nisso para te preparares para o início do Advento, quando celebramos a vinda d’Aquele que salva o homem de seu pecado e de sua mortalidade; vê através das pompas e vaidades do que o mundo julga valioso e fixa teu olhar na santidade, em imitação dos muitos santos que, começando com o Precursor São João Batista, buscaram o deserto, ou melhor, buscaram a Deus que os chamou e enobreceu. Há algo de irônico ou paradoxal na forma como a liturgia tradicional encerra o ano e o inicia novamente — como se ilustrasse o verso de T. S. Eliot: “É assim que o mundo acaba / Não com um estrondo, mas com um gemido.” Pelo menos, é assim que o mundo termina na morte de cada um de nós, no momento em que damos nosso último suspiro. O silêncio do túmulo conduz ao silêncio de uma estação invernal que nos apresenta uma família pobre, um estábulo, uma manjedoura, um infante envolto em faixas e nenhuma perspectiva de vitória divina — exceto a quase imperceptível crescente da luz do dia.

Voltando ao início do ciclo Santoral, encontramos tradicionalmente a festa de Santo André Apóstolo em 30 de novembro. Já que o Santoral se ocupa de recordar, venerar e invocar os discípulos do Senhor, é supremamente adequado que o primeiro santo seja Santo André, que é o primeiro discípulo do Senhor em Seu ministério público. A Igreja Bizantina dá a André o epíteto litúrgico oficial “Πρωτόκλητος”, isto é, “o primeiro chamado”, e vemos no arranjo do calendário romano uma prioridade e proeminência análogas.

Dessa forma, o Santoral tal como impresso no missal de altar e em nossos missais diários reflete a prioridade do chamado do discípulo de Cristo — “Vem, segue-Me” — e a necessária autorrenúncia e via crucis que isso implicará, ao seguirmos Aquele em quem “habita corporalmente toda a plenitude da divindade” (Cl 2, 9), em vez da vacuidade das coisas deste mundo. Toda a vida cristã é uma passagem pelo deserto para se alcançar a comunhão da terra prometida — e dessa passagem, o ciclo Santoral, em geral e em detalhe, é uma representação vívida.

A festa do Apóstolo André é celebrada há mais de mil anos, enquanto a do Abade São Silvestre é celebrada há apenas um século e um quarto. Mas se alguém vê o calendário litúrgico como a construção de uma grande catedral — digamos, a de Milão, iniciada em 1386 e oficialmente concluída em 1965, levando quase 600 anos — percebemos como seu desenvolvimento acrescenta pedra após pedra, estátua após estátua, até que toda a estrutura esteja terminada. Ao adicionar São Silvestre Gozzolino ao Santoral, o Papa Leão XIII acrescentou uma pedra final conveniente à estrutura do ciclo santoral, tornando-o ainda mais frutuoso espiritualmente para aqueles que utilizam o usus antiquior.

Como pós-escrito, deve-se tristemente observar que a maneira como o novo Missal Romano (paulino) organiza o ciclo Santoral se afasta da estrutura, estável por mais de meio milênio, que começa na transição de novembro para dezembro e termina na última semana de novembro. Numa mudança ilustrativa da identificação entre aggiornamento e secularização, o novo ciclo Santoral conforma-se ao calendário secular hoje triunfante, começando em 1º de janeiro (na verdade, 2 de janeiro) e terminando em 31 de dezembro, embora essas datas não tenham qualquer significado especial no ano litúrgico que se desenrola desde o Advento até o tempo após Pentecostes. O usus antiquior, tanto em seu ciclo Temporal quanto no Santoral, testemunha de modo constante uma estruturação do tempo mais antiga e mais autorizada.

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