Virtudes sobrenaturais
As virtudes podem ser divididas, antes de mais nada, em duas categorias para que possam ser conceituadas. As primeiras são as naturais, ou seja, os bons hábitos adquiridos da frequência de repetições, pelos quais se adere uma disposição estável para agir de determinado modo. Essas virtudes podem ser adquiridas por pagãos ou pessoas incrédulas, porque pelo hábito é possível aperfeiçoá-las.
As virtudes naturais podem ser divididas em intelectuais e morais, sendo as primeiras relacionadas ao exercício de hábitos cognoscitivos ou especulativos, ou seja, aqueles que visam a melhoria do conhecimento teórico, o trabalho intelectual em si, dentre as quais estão a ciência, sabedoria, arte, prudência e inteligência. As morais são aquelas que se voltam ao hábitos apetitivos ou operativos, ou seja, à atividade prática, donde podem se destacar as quatro principais, prudência, justiça, temperança e fortaleza, que estarão também da lista das virtudes infusas, a quais serão tratadas a seguir.
As outras são a de caráter sobrenatural, também chamadas infusas, entendidas como as qualidades inseridas em nós por Deus para que possamos desempenhar faculdades sobrenaturais, de modo a praticar atos meritórios.
Então, as virtudes infusas e naturais se diferenciam em três pontos:
1. Origem: as virtudes naturais adquirem-se pela repetição dos mesmos atos, enquanto que as sobrenaturais vem de Deus por meio da graça santificante, advinda com o Batismo ou Confissão;
2. Exercício: nas virtudes naturais há facilidade de produzir atos semelhantes com prontidão por causa do hábito adquirido; pelas infusas temos o poder de ter méritos, tendo uma tendência a realizar as virtudes;
3. Finalidade: as virtudes naturais tendem a um bem honesto, orientando-nos indiretamente a Deus, ao passo que as infusas têm por finalidade o bem sobrenatural, levando-nos diretamente a Deus, ou seja, a prática delas se dá para se viver em harmonia com Nosso Senhor.
Logo, as virtudes infusas nos fazem mais perfeitos que as naturais, porque, como dito acima, a finalidade daquelas é muita mais sublime e, além disso, são postas em nós pela obra de Deus para que vivamos retamente.
Não se pode dizer, por outro lado, que as virtudes infusas não são aperfeiçoadas com o hábito, porque é também por meio dele, como nas virtudes naturais, que se terá prontidão, facilidade e prazer em exercê-las. Sendo assim, o hábito diminuirá os obstáculos da má natureza e as suas resistências, obtendo-se assim melhores resultados, além de tornar dóceis as nossas faculdades, ou seja, de fazê-las prontas ao exercício do bem. Além disso, teremos a graça atual, vinda de Deus, na medida em que correspondermos bem ao exercício da virtude.
As virtudes sobrenaturais podem ser incrementadas, ou seja, aperfeiçoadas, ou ainda reduzidas ou perdidas. Incrementa-se mediante os seguintes meios:
1. Dos sacramentos, pelos quais se tem o aumento da graça em nós;
2. Das boas obras, pelas quais também recebemos o aumento da graça e exercemos o hábito da virtude;
3. Da oração, pela qual pedimos a Deus o aumento da graça e das virtudes;
O enfraquecimento se dá pelo cometimento do pecado venial, que não reduz a graça ou a virtude infusa, mas embaraça o exercício dela. A perda delas se dá pelo pecado mortal, pois a graça santificante é expulsa da alma, com a qual saem as virtudes de natureza sobrenatural, permanecendo somente a facilidade de exercer o hábito da virtude, por ser algo adquirido. É importante esclarecer que este hábito pode ser perdido com o tempo pela ausência da amizade com Deus.
As virtudes infusas são divididas da seguinte maneira:
1. Virtudes Morais (cardeais): tem por objeto um bem honesto distinto de Deus que favorece a perpétua união com Ele;
A palavra cardio, do latim, que dá origem à palavra cardeal, significa dobradiça ou gonzo da porta ou ainda eixo. Isso quer dizer que as virtudes cardeais são como o eixo em torno do qual as outras virtudes morais giram. Além disso, assim como a porta consegue exercer sua função (movimento) por causa das dobradiças, assim também o homem conseguirá exercer sua singular função de conhecer, amar e servir a Deus por meio das virtudes morais.
Estas virtudes aplicam-se em conservar o meio termo nas nossas ações – virtus in medio est –, ou seja, não podemos exercer nossas atividades ultrapassando as medidas ou ficando aquém do necessário. Tudo isto se fará pela reta razão iluminada pela fé.
Elas são divididas em quatro principais, correspondendo a todas as necessidades da alma:
a) Prudência: auxilia na escolha dos meios necessários e úteis à consecução do nosso fim sobrenatural;
b) Justiça: respeito ao direito do outro dando-lhe o que é devido;
c) Fortaleza: auxilia na defesa de nossa pessoa e bens contra os perigos, sem temer nem mesmo a morte;
d) Temperança: para utilizar-se dos bens deste mundo, sem ultrapassar a medida, moderando a atração para o prazer sensível.
2. Virtudes Teologais: tem Deus por objeto material e algum atributo divino por objeto formal;
São os três elementos essenciais da vida cristã e, por isso, são superiores à morais. S. Paulo exorta os Tessalonicenses a revestir-se da couraça da fé e da caridade, e ter por elmo a esperança da salvação (Ts. 5, 8).
O papel delas é essencialmente nos unir a Deus e a Nosso Senhor Jesus Cristo, transformando-nos em participantes da vida divina. São as seguintes:
a) A Fé que nos une a Deus que é verdade infinita, dando-nos a conhecê-lo verdadeiramente;
b) A Esperança que nos une a Deus que é suprema beatitude, esperando com firmeza a felicidade do céu;
c) A Caridade que nos une a Deus, bondade infinita, amando-O por ser tão bom e amável.
Completam-se assim as sete virtudes infusas, que muito nos servem de auxílio para alcançar o verdadeiro amor a Deus, de modo a, antes de mais nada, não mais ofendê-lO pelo pecado.