A Confraria da Boa Morte

Outrora muito difundida, a Confraria da Boa Morte, também conhecida pelo título em latim como Bona Mors, desde sua fundação incentivou muitos católicos a buscarem uma vida exemplar com especial preocupação na preparação para a morte.

Inicialmente fundada como uma Congregação Mariana, desenvolveu-se nas devoções particulares que eram a Agonia de Nosso Senhor na Cruz e as Dores de Nossa Senhora, a ponto de possuir regras particulares e privilégios próprios, que podiam ser compartilhados com outras confrarias que se unissem a ela, da mesma forma como as Congregações Marianas no mundo inteiro filiadas à Prima Primária Romana.

Encontram-se muitos registros de confrarias no mundo inteiro filiadas à Bona Mors da Igreja de Jesus em Roma:

Carta de Admissão à Confraria da Boa Morte da Catedral de Straßburg, de agosto de 1772.

 

Livro de Registro de membros da Confraria da Boa Morte da Igreja dos jesuítas de São Miguel, em Passau (Alemanha) – 1738.

 

Data de 2 de Outubro de 1648 a fundação da Confraria da Boa Morte na Igreja de Jesus em Roma, pelo padre Vincenzo Caraffa, sétimo Superior Geral da Companhia de Jesus. Fundada não apenas com regras inspiradoras, mas também por um sacerdote de santidade reconhecida: teve a honra de ser citado por São Luís Maria Grignion de Montfort no Tratado da Verdadeira Devoção, no número 242:

Esses amorosos escravos de Jesus Cristo ou acorrentados de Jesus Cristo, “vincti Christi” (Ef 3, 1), podem usar suas cadeias ou ao pescoço ou no braço, ou na cintura, ou nos pés. O padre Vicente Caraffa, sétimo geral da Companhia de Jesus, falecido em odor de santidade no ano 16431, usava, como sinal de sua servidão, um círculo de ferro nos pés, e dizia que lamentava não poder arrastar publicamente os grilhões.

Pe. Vincenzo Caraffa, Sétimo Superior Geral da Companhia de Jesus

 

Reproduzimos as primeiras regras da Confraria da Boa Morte, inéditas em língua portuguesa, retiradas do livro The Manual of the Bona Mors Confraternity, de Nova York, 1896:

 

I – Origem

Esta confraria foi fundada no dia 2 de Outubro de 1648, na Igreja de Jesus em Roma, pelo padre Vincenzo Caraffa, sétimo Superior Geral da Companhia de Jesus.
Foi aprovada pelo soberano Pontífice Inocêncio X e Alexandre VII. Em 1729 foi erigida como uma Arquiconfraria e enriquecida com inúmeras indulgências pelo Papa Bento XIII. Ele autorizou o padre Superior Geral da Companhia de Jesus, que foi o diretor, em virtude de seu ofício, a erigir a Confraria Bona Mors em todas as Igrejas de sua Ordem. Em 1827 o Papa Leão XII deu ao Diretor Geral o poder de erigir e afiliar confrarias associadas em Igrejas não pertencentes à Companhia de Jesus e a estender a elas todos os privilégios e indulgências da Arquiconfraria.

II – Objetivo

O curto título em latim, Bona Mors, que quer dizer Boa Morte, atesta o objetivo da associação: preparar os seus membros para que tenham uma morte na amizade de Deus, através de uma vida bem regrada.

III – Meios

O título completo: “Confraria de Nosso Senhor Agonizante e da Santíssima Virgem das Dores” exprime o principal meio para atingir tal objetivo: devoção à Paixão de Cristo e às Dores de Nossa Senhora. Além disso, a união nas orações e boas obras dos membros, especialmente as instruções públicas nas reuniões ajudam grandemente no preparo para uma boa morte.

IV – Admissão

As condições para admissão de membros são as seguintes: a) apresentar-se ao Padre Diretor; b) expressar a ele o desejo de se tornar um membro; c) receber do Padre Diretor um sinal formal de aceitação, geralmente na forma de um Certificado de Admissão; d) e ter o nome inscrito no Registro da Confraria Bona Mors local.
Por essas condições, é evidente que crianças pequenas, ausentes e já falecidos não são elegíveis para admissão.2 Apenas “por uma exceção incomum e extraordinária”, diz o Decreto da Sagrada Congregação de Indulgências, “é permitido a admissão desses ausentes.” O Padre Diretor está autorizado a decidir o que constitui tal caso excepcional.
Não há qualquer taxa de admissão; as despesas para reuniões, impressões, etc., podem ser obtidas através de contribuições mensais ou de coleta.
Não se usa qualquer símbolo exterior;
Não há qualquer cerimonial para a recepção de membros, mas no caso da recepção de muitos candidatos ao mesmo tempo, é edificante para eles recitar juntos o ato de Consagração.

V – Práticas

As seguintes práticas são recomendadas: a) rezar diariamente três Pai Nossos e três Ave Marias em honra às três horas de Agonia de Nosso Senhor crucificado; b) comparecer a todas as reuniões públicas; c) acolitar na Santa Missa mesmo em dias de semana; d) realizar exame de consciência todas as noites; e) receber os sacramentos da Confissão e da Sagrada Eucaristia uma vez por mês, ou mais frequentemente se possível; f) separar um dia todos os meses ou pelo menos algum tempo todos os anos em preparação para a morte; g) praticar obras de misericórdia, visitar os doentes e cuidar que recebam os últimos sacramentos na devida hora; h) acompanhar os mortos até o túmulo e rezar por eles; i) receber para as almas dos membros falecidos as indulgências de uma Sagrada Comunhão e de um terço do Rosário; j) realizar algum ato de mortificação ou penitência às sextas-feiras; k) ter no quarto um crucifixo e uma representação de Nossa Senhora das Dores diante dos quais se deverá rezar os três Pai Nossos e três Ave Marias; l) ter especial devoção a São José; m) finalmente, por toda uma vida, honrar os sofrimentos de Nosso Senhor e de Nossa Senhora no Calvário, e por isso obter para si e para os ainda vivos uma boa morte, e para os fiéis falecidos uma breve libertação das penas do Purgatório;

VI – Privilégios 3

As seguintes indulgências podem ser obtidas pelos membros da Confraria e aplicadas às santas almas do Purgatório:

Plenárias:

1. No dia da Admissão;
2.
Na hora da morte;
3. 
Em qualquer sexta ou domingo de cada mês ao comparecer à Exposição do Santíssimo Sacramento como costume durante as reuniões;
4. 
a) Nas festas da Natividade, Epifania, Ressurreição e Ascensão de Nosso Senhor; no Domingo in Albis, Domingo da Santíssima Trindade e Corpus Christi; b) Nas festas da Imaculada Conceição, Natividade, Anunciação, Purificação e Assunção de Nossa Senhora; (c) Nas festas da Natividade de São João Batista, dos Apóstolos São Pedro e São Paulo, Santo André, São Tiago, São João, São Tomé, São Filipe e São Tiago, São Bartolomeu, São Mateus, São Simão e São Judas, São Matias, São José e no dia de Todos os Santos;
5. No Terceiro Domingo depois da Páscoa (Patrocínio de São José) e no Terceiro Domingo de Setembro (Festa das Sete Dores de Nossa Senhora). Todas essas indulgências podem ser obtidas nas condições usuais de Confissão, Comunhão e orações pelas intenções do Santo Padre.
6. As indulgências das “Estações” em Roma podem ser lucradas nos dias especificados visitando a Igreja ou Capela da Confraria e recitando sete Pai Nossos e sete Ave Marias.

Parciais:

1. De sete anos e sete quarentenas por assistir à Exposição do Santíssimo Sacramento durante as reuniões em Domingos ou Sextas;
2. De um ano pelas seguintes boas obras: Assistir a Santa Missa em dias de semana; pelo exame de consciência à noite; pela visita a doentes e presos; assistência em funeral;

VII – Reuniões

As reuniões públicas são realizadas pelo menos uma vez ao mês às Sextas ou Domingos. Os dias mencionados são os especificados para se lucrar indulgências.

VIII – Exercícios

As instruções devem ser sobre a Paixão de Nosso Senhor, as Dores de Nossa Senhora, os Novíssimos do Homem ou assuntos relacionados. Durante a Exposição do Santíssimo Sacramento deve-se rezar por uma vida santa e uma boa morte para os membros e por todos os fiéis falecidos.

Altar da Confraria da Boa Morte da Igreja de São Francisco Xavier em Liverpool, Inglaterra.

Ordem da Reunião

  1. Oração Inicial;
  2. Hino;
  3. Anúncios;
  4. Instrução;
  5. Exposição do Santíssimo Sacramento;
  6. O Salutaris;
    1. Ladainha para uma Boa Morte;
    2. Estações da Via Sacra;
    3. Devoção das Cinco Chagas;
    4. Colóquio com Cristo Crucificado;
  7. Tantum Ergo;
  8. Bendições;
  9. Laudate ou Parce;
  10. De Profundis

Nota: Nas Igrejas onde a devoção da Confraria da Boa Morte seguir as Vésperas, omite-se o hino. Uma ou duas pessoas são suficientes para o serviço;

Quando os membros são recebidos publicamente, deve-se fazê-lo após a Instrução e o Ato de Consagração pode ser rezado. Ao invés dos hinos, podem ser cantados alguns versos do Stabat Mater.

Iluminura do Manual e Devocionário da Confraria da Boa Morte de Passau, Alemanha.


 

  1. Há uma divergência na data de falecimento do Pe. Caraffa, mas hoje se sabe que o ano de sua morte foi 1649
  2. Nota do Tradutor: pelo fato de haver muitos privilégios nesta confraria, poder-se-ia solicitar o ingresso de pessoas já falecidas, para que lucrassem indulgências, mas isto não é possível. Por isso o esclarecimento que parece um tanto óbvio.
  3. Para se lucrar quaisquer dessas indulgências é necessário que a Confraria seja fundada canonicamente com aprovação do ordinário local e devidamente filiada à Bona Mors da Igreja de Jesus em Roma.

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