MEDITAÇÃO PARA A DEVOÇÃO DOS PRIMEIROS SÁBADOS
1.º Mistério Gozoso – A Anunciação de Maria Virgem
Evang. de São Lucas, c. 1.
I.
Abrem-se, finalmente, os Céus e vem ao mundo Aquele que pelos Profetas é chamado o Justo, o Desejado dos Patriarcas, a Expectação das gentes, o Enviado de Deus. Estão completas as semanas de Daniel; realizadas as profecias de Jacó, pois que o cetro de Judá passou já para as mãos de Herodes, rei estrangeiro. Uma donzela de Jessé, ficando Virgem, deve dar ao mundo um Homem, que é o Filho do Altíssimo.
Alma minha, entendes tu o que quer dizer – O Verbo se fez homem?
Ó bondade e misericórdia infinita do Senhor! Tanto este Deus te amou, com tal excesso, que quis que seu Filho Unigênito se humilhasse até tomar forma de servo, e isto para que pudesse padecer e morrer sobre uma cruz para resgatar-te do inferno e abrir-te as portas do Paraíso, para perpetuar-se todos os dias sobre os altares e ficar sempre contigo, dando-se-te em alimento na Sagrada Eucaristia! Santíssima Trindade, adoro-vos humildemente e dou-vos graças por tanto amor.
O Pai dá aos homens o seu Filho. O Verbo consente em fazer-se Homem. E o Espírito Santo oferece-se para operar este grande mistério.
Qual é a minha correspondência a tanta caridade?
Considera, alma minha, de um lado a altíssima dignidade e os sublimes favores da Bem-Aventurada Virgem, do outro a sua perfeita humildade. É um Deus que cria imaculada Aquela que deve ser sua Mãe, e desde o primeiro momento da sua conceição eleva-lhe a santidade acima dos cumes dos montes mais santos.
Eis as palavras do Senhor nos sagrados Cânticos: Há um sem número de donzelas; porém uma é minha pomba, a minha perfeita. (Cânt. 6).
E esta foi a Mãe de Deus, escolhida pela sua humildade que nela resplandeceu. Também Maria nos Cânticos é comparada ao nardo odorífero, por isso que, comenta Santo Antonino, a humilde e odorífera planta do nardo figura a humildade de Maria, cujo cheiro subiu ao Céu e atraiu ao seu seio virginal o Verbo Divino. Porquanto, acrescenta o mesmo Santo, Arcebispo dominicano, a humildade da Virgem foi a disposição mais perfeita e mais próxima para ser mãe de Deus.
S. Bernardo conclui: Se Maria agradou a Deus pela sua virgindade, todavia foi pela humildade que concebeu o Filho de Deus. A mesma Virgem, aparecendo um dia a Santa Brígida, disse: Porque mereci eu uma tal graça de ser feita Mãe do Senhor, senão porque conheci o meu nada e me humilhei? E, para o atestar a todas as gentes, tinha ela exclamado no seu humilde Cântico: Porque Deus olhou para a humildade da sua serva… fez coisas grandes o que é poderoso.
Os olhos humílimos de Maria, como de pomba simples e humilde, com que sempre olhava para a divina grandeza, nunca perdiam de vista o próprio nada. E tal violência fizeram ao mesmo Deus, que se deixou atrair para o selo dela: Como és bela, amiga minha! Como és bela com esses olhos de pomba! (Cânt. 4).
Por seu lado o Senhor, para maior mérito desta Mãe, não quis fazer-se seu filho sem primeiro obter o consentimento dela. E expede-lhe um mensageiro de primeira ordem, Gabriel, a força de Deus, para revelar-lhe o grande acontecimento, a Encarnação do Verbo no seu seio.
Ó grande, ó santa humildade de Maria! Tu tornaste essa Mãe singularíssima, pequena para si mesma, mas grande diante de Deus! Indigna a seus olhos, mas digna aos olhos daquele Senhor Imenso que o mundo não pode abranger!
E como, ó Senhora, exclamarei eu com S. Bernardo, como pudeste unir no teu coração um tão humilde conceito de ti mesma, com tanta pureza, com tanta plenitude de graça que possuis? Salve, ó Rainha humilíssima, de ti e por ti começou a obra da nossa redenção. Ah! torna-me participante da tua humildade e concede-me o teu perfeito amor e o de teu Filho;
II.
Alma minha, olha como o Anjo não é expedido às grandes cidades, aos palácios dos príncipes, às filhas dos reis ornadas de ouro, mas a Nazaré, pequena cidade, a uma virgem, esposa de José, o carpinteiro! Não são, portanto, o nascimento, nem os dons da natureza, que atraem as visitas de Deus; o verdadeiro merecimento, a seus olhos, é a humildade, a modéstia, a inocência dos costumes, o amor da pureza.
Maria vivia solitária na sua pobre casinha, como foi revelado a Santa Isabel, beneditina: e suspirava e suplicava a Deus com maior desejo, do que antes, que mandasse ao mundo o Redentor prometido, quando lhe apareceu o Arcanjo Gabriel. Três títulos lhe dá de uma incompreensível grandeza:
- O primeiro refere-se a ela mesma: Deus te salve, cheia de graça, como se lhe dissera: Tu és a mais santa entre todas as criaturas, tu és um tesouro de todas as virtudes, de todas as graças e favores de Deus.
- O segundo diz respeito a Deus: O Senhor é contigo, isto é: Tu és a sua protegida, cortejada e amada.
- O terceiro refere-se aos homens: Bendita és tu entre as mulheres, isto é: tu és privilegiada, elevada acima de todas… Com que respeito devemos dirigir estas mesmas palavras a Maria, quando rezamos o rosário.
E Maria perturba-se e cala-se às palavras de um Anjo que lhe fala de Deus. Oh, quanta humildade neste silêncio! Os louvores incomodam-na, assustam-na, nada atribui a si, tudo a Deus. Perturba-se, como o revelou a Santa Brígida, porque, sendo cheia de humildade, aborrecia todo o louvor próprio; desejava que só o seu Criador e autor de todo o bem fosse louvado e bendito.
Que diferença entre Maria e Lúcifer! Lúcifer, vendo-se dotado de grande beleza, aspirou, como disse Isaías, a exaltar o seu trono acima das estrelas e a tornar-se semelhante a Deus. E que teria dito e pretendido o soberbo, se se visse elevado às grandezas de Maria? A humilde Virgem não fez assim; quanto mais se viu exaltada, tanto mais se humilhou; e esta humildade foi a beleza com que enamorou o Rei dos reis.
E estava pensando que saudação seria esta. E tu, alma minha, como imitas Maria nos louvores perigosos que te dão os homens, pelo talento, pela elegância das tuas maneiras, pela beleza, pela nobreza? Ai de ti! Cheia de orgulho, julgas merecê-los, tens nisso desvanecimento; e, se mostras recusá-los, é para alcançar outros maiores. Que queixas vergonhosas, efeito da adulação!
Ó Maria, ó divina reparadora de todos os nossos males, ó digna mãe de Deus, quanto me confunde a tua humildade sublime! E eis o motivo por que todas as gerações te chamarão bem-aventurada. Quanto pesar eu sinto de ter por tantas vezes ofendido o meu Deus com a minha soberba, e contristado o seu coração doce e humilde!
Mas, se para mim olhardes com olhos de mãe piedosa, logo com Ele me reconciliarei: se souber amar-te, deixarei de ser infeliz. Na tua mão estão todas as graças. Tu podes salvar quem quiseres. Ó cheia de graça, salva esta minha alma.
III.
Finalmente, assegurada de que não perderia a virgindade, Maria dá o seu consentimento em duas palavras: Eis a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra. Oh, palavras benditas que consumaram o mistério da encarnação, realizaram as profecias, repararam a desobediência dos nossos primeiros pais e as dolorosas consequências do triste colóquio de Eva com o Anjo das trevas! Palavras admiráveis, em que resplandece a fé mais viva, a humildade mais profunda, a obediência mais submissa, o amor mais terno, e o abandono mais perfeito à vontade divina. Palavras que a Igreja, para reconhecimento, põe três vezes ao dia na boca de seus filhos. Di-las também tu continuamente, alma minha, e com os mesmos sentimentos de Maria. Aprende a ser humilde e resignada ao que Deus dispõe a teu respeito.
Confunde-te por seres tão maligna e tão dissemelhante de Maria e, o que é pior, por não saberes chorar, nem orar. Começa, ao menos agora, a emendar-te do teu deplorável estado, detesta a tua vida desordenada, começa a dar-te à oração. E, se sentes que tens um coração de pedra dura, volta-te para Maria e pede-lhe que, por amor desta sua Anunciação, queira trocar-te o teu coração pelo seu, humilde e puro.
Ó grande Mãe de Deus, mar imenso de graça e de bem-aventurança, bem-aventurado serei eu, também, se viver debaixo da vossa proteção. Sim, deste dia em diante até à morte, nunca deixarei de amar-vos, de saudar-vos com a vossa oração predileta, que vós mesma me ensinastes, do Santo Rosário, que todos os dias me recorda a vossa inexcedível humildade, a vossa pureza e plenitude de graça, a vossa divina maternidade, a nossa Redenção e salvação.
Bendita e amada sejais por todos os povos, ó vós que sois o nosso remédio, nossa consolação, nossa glória.
Assim seja.
Virtude – Humildade.
Ramalhete – Humilhai-vos interiormente à vista das vossas misérias. Humilhai-vos também exteriormente, ocupando o último lugar, dando preferência aos iguais e inferiores.
Sofrei hoje as repreensões que vos derem, merecidas ou não, sem vos desculpardes. Sufocai o orgulho, falando em voz baixa, e não falando de vós nem bem nem mal.
Jaculatória – Ó Maria, Virgem bela e imaculada, tornai o meu coração puro e humilde como o vosso Coração.
Os Quinze Sábados do Santíssimo Rosário, traduzido do italiano pelo pe. Miguel Ferreira de Almeida.
Adaptação ao português moderno e grifos de um Congregado Mariano da CM da Imaculada Conceição