Novas evidências confirmam ausência de justificativa para restringir a Missa Tridentina

Fonte: Diane Montagna

Tradução por salvemaria.com.br

Novas evidências vieram à tona confirmando a autenticidade dos documentos publicados semana passada pela jornalista Diane Montagna do relatório final da consulta feita aos bispos em 2020 pela Congregação para a Doutrina da Fé (CDF) sobre a aplicação do Motu Proprio Summorum Pontificum de Bento XVI liberando o uso da liturgia tradicional romana.

As seções publicadas dia 1º de julho incluíam a avaliação geral do relatório da CDF sobre os resultados da pesquisa junto aos bispos e uma coleção de citações dos bispos, com o objetivo de dar ao Papa Francisco uma representação geral de suas respostas.

Desde a publicação desse artigo, a jornalista Diane Montagna obteve do Vaticano um número de protocolo para o relatório final da CDF. Além disso, ela obteve a introdução da segunda parte do relatório, que confirma que a avaliação geral constituía a “opinião oficial da Congregação para Doutrina da Fé”, à qual o Papa Francisco se referiu no seu motu proprio Traditionis Custodes, restringindo o uso da liturgia tradicional romana.

Isso se segue após os comentários de semana passada do porta-voz do Vaticano, Matteo Bruni, que diminuiu o relatório publicado pela jornalista Montagna no dia 1º de julho. O porta-voz disse que não confirmaria a autenticidade do documento e que eles eram “presumivelmente” apenas partes “muito parciais e incompletas” do processo de decisão que levou o Papa Francisco à publicação do Traditionis Custodes e que outros documentos e “relatórios confidenciais” foram levados em consideração na decisão final do Papa, algo que o Vaticano não tinha revelado até então.

Porém, os comentários de Bruni apenas levantam mais questionamentos do que respostas. Na carta que acompanha o motu proprio Traditionis Custodes, o Papa Francisco deixou claro que foram as respostas à consulta de 2020 da CDF que o persuadiram da “necessidade de intervir”, mesmo que – como veio à tona recentemente – o relatório geral  concluía que “a maioria dos bispos que responderam ao questionário alegaram que alterações ao status quo do Summorum Pontificum causariam mais males do que bens”.

Então, se havia, como alegou Bruni, documentos adicionais e relatórios confidenciais que foram levados em conta no processo de decisão que levou à publicação da Traditionis Custodes, algo que o Vaticano alega apenas depois de detalhes da consulta terem sido publicados no dia 1º de julho, esses documentos teriam logicamente que provar que o relatório final da CDF “representou incorretamente” aquilo que a maioria dos bispos respondeu, e que, portanto, o Papa Francisco teria o apoio da maioria do episcopado quando impôs seu motu proprio Traditionis Custodes restringindo o uso da liturgia tradicional romana.

Isso levanta o questionamento: se o que Matteo Bruni diz é verdade, por que o Papa Francisco não se referiu a esses “documentos adicionais” no seu Traditionis Custodes, dado que eles presumivelmente davam a ele a base para a sua decisão de “abrogar” o Summorum Pontificum?

 

Número de Protocolo Revelado

A foto abaixo prova a autenticidade do relatório final da CDF contendo a avaliação geral e a coleta de citações que foram publicadas pela jornalista Diane Montagna na semana passada:

 

O número de protocolo, indicado no topo da página, é: N. 03/2020-ED.

Uma tradução da foto diz: Congregação para a Doutrina da Fé; Protocolo número 03/2020-ED; Consulta aos Bispos acerca da Aplicação do Motu Proprio Summorum Pontificum, Abril de 2020; Relatório; Fevereiro de 2021.

A consulta provavelmente foi datada para Abril de 2020 porque as respostas ao questionário começaram a chegar à CDF por correio ou email nesse mês.

De acordo com os números do protocolo do Vaticano, “03/2020”, parece indicar que o relatório é o terceiro documento de um processo iniciado em 2020. O primeiro documento nesse processo deve ter sido provavelmente pedido pelo Papa Francisco à Congregação para Doutrina da Fé, para que realizasse a consulta aos bispos sobre a implementação do Summorum Pontificum.

O segundo documento do processo, que teria recebido o número de protocolo “02/2020-ED”, foi o questionário de nove pontos que a CDF enviou na primavera de 2020 aos presidentes das conferências episcopais de todo o mundo para serem distribuídos aos bispos locais.

 

Evidência Adicional

Junto ao número de protocolo do Vaticano, um segundo conjunto de imagens do relatório da CDF mostra a primeira e a última página da “avaliação geral” (Giudizio Complessivo), no original em italiano. Datada de 22 de Fevereiro de 2021, Festa da Cátedral de São Pedro.

 

Uma terceira imagem do relatório da CDF mostra a primeira página da coleção de citações (Floregio) retirados das respostas recebidas das dioceses, no original em italiano, que a jornalista Diane Montagna também publicou no dia 1º de julho.

 

O Papel Central do Relatório da Congregação para Doutrina da Fé de acordo com o Traditionis Custodes

Em ambos os documentos, no Traditionis Custodes e na carta que acompanha o decreto, o Papa Francisco deixou claro que os resultados da consulta dos bispos realizada pela Congregação para Doutrina da Fé desempenharam um papel que o levou a impor restrições à liturgia romana tradicional.

O Papa escreve em seu motu proprio:

Na senda da iniciativa do meu venerado antecessor Bento XVI de convidar os bispos a uma avaliação da aplicação do Motu Proprio Summorum Pontificum, três anos após a sua publicação, a Congregação para a Doutrina da Fé levou a cabo uma ampla consulta aos bispos no ano 2020, cujos resultados foram ponderadamente considerados à luz da experiência adquirida nestes anos

Ora, tendo em conta os desejos formulados pelo episcopado e ouvido o parecer da Congregação para a Doutrina da Fé, desejo com esta Carta Apostólica prosseguir mais ainda na procura constante da comunhão eclesial.

 

E endereçando os bispos de todo o mundo na carta que acompanha o motu proprio:

Passados treze anos, encarreguei a Congregação para a Doutrina da Fé de vos enviar um questionário sobre a aplicação do Motu proprio Summorum Pontificum. As respostas recebidas revelaram uma situação que me entristece e me preocupa, confirmando-me na necessidade de intervir.

 

Desde a publicação do artigo da jornalista Diane Montagna em 1º de julho, ela obteve uma seção adicional da Quarta Seção do relatório da Congregação para Doutrina da Fé que mostra claramente a opinião oficial da Congregação sobre a consulta aos bispos. A nova seção obtida pela jornalista forma a introdução ao relatório da Segunda Parte (entitulada “Synthesis” ou “Sumário” em português), que consiste na introdução, um sumário de cada continente e uma avaliação geral. A Segunda Parte é seguida de uma coleção de citações e de um índice.

 

A introdução à Segunda Parte do relatório da CDF afirma:

De acordo com a vontade do Santo Padre, a Congregação para Doutrina da Fé realizou um inquérito sobre a aplicação do Motu Proprio Summorum Pontificum em todo o mundo, treze anos após a sua promulgação (2007-2020). A Quarta Seção (antiga Comissão Ecclesia Dei) foi encarregada de estudar as respostas, processar os dados e produzir uma síntese acompanhada de uma avaliação geral das respostas ao questionário recebido pelo Dicastério.

[…]

O presente trabalho busca apresentar as conclusões mais significativas do inquérito supracitado, incluindo uma análise estatística das respostas coletadas (cf. Parte I, pp. 11-170), um resumo das respostas de vários Prelados por região geográfica e uma avaliação geral do questionário realizado (cf. Parte II, pp. 171-184). Por fim, o Apêndice contém um Florilégio de citações (p. 185) extraídas dos relatórios dos bispos, juntamente com um índice de nomes de lugares (p. 194). (destaques no original).

 

É claro, portanto, que o relatório extensivo preparado pela Quarta Seção da CDF (protocolo número 03/2020-ED), que teria sido aprovado pelo então prefeito da CDF, Cardeal Luis Ladaria, SJ, continha as “consultas detalhadas dos bispos em 2020” a que o Papa Francisco se refere na Traditionis Custodes.

 

A Resposta do Vaticano

Esta nova evidência vem à tona apenas dias depois de o porta-voz do Vaticano, Matteo Bruni, tentar diminuir a importância que duas seções do relatório que foram publicadas no dia 1º de julho.

Em uma conferência de imprensa do Vaticano no dia 03 de julho sobre a “Missa pelo cuidado da Criação”, um repórter teve a oportunidade de pedir a um dos membros do painel, o Arcebispo Vittorio Francesco Viola, Secretário para o Dicastério para o Culto Divino e Disciplina dos Sacramento, um parecer ou esclarecimento sobre as seções do relatório da CDF que foram publicados no dia 1º de julho.

O Arcebispo Viola, que se acredita ter sido fundamental no processo que levou à publicação do Traditionis Custodes, imediatamente se voltou para o porta-voz Matteo Bruni, que – após repreender o repórter por fazer uma pergunta não inerente à “Missa pelo Cuidado da Criação” – pegou um pedaço de papel e leu essa resposta preparada:

 

“Não confirmo a autenticidade dos textos que foram publicados, que presumivelmente concernem a parte dos documentos com base nos quais a decisão [de publicar Traditionis custodes] foi tomada, e por isso, contribui para uma reconstrução que é bastante parcial e incompleta no que se refere ao processo de tomada de decisão. De fato, uma documentação adicional foi  posteriormente adicionada à consulta mencionada, incluindo outros relatórios confidenciais resultantes das consultas adicionais que foram submetidos à Congregação para Doutrina da Fé. Dito isto, nada mais tenho a acrescentar sobre este assunto”. (ênfase adicionada)

É importante destacar que o atual prefeito para a Congregação para Doutrina da Fé, o cardeal Victor Manuel Fernandez, também estava presente na audiência em que Matteo Bruni leu a declaração.

Uma vez que evidências definitivas da autenticidade dos textos publicados semana passada vieram agora à tona, podemos elaborar os seguintes pontos em resposta à declaração feita pelo porta-voz do Vaticano:

 

  1. No Motu Proprio Traditionis Custodes e na carta que acompanha o decreto, o Papa Francisco claramente diz que decidiu intervir nesse assunto com base nos resultados detalhados da consulta aos bispos em 2020 realizada pela Congregação para Doutrina da Fé. Ele não se refere, mesmo obliquamente, a qualquer outra “documentação adicional” ou “outros relatórios confidenciais resultantes de consultas adicionais”, agora mencionados por Matteo Bruni.
  2. Quatro anos depois da publicação da Traditionis Custodes, veio agora à tona que o relatório final da CDF revela que “a maioria dos bispos que respondeu ao questionário declararam que realizar mudanças legislativas ao Summorum Pontificum de Bento XVI causaria mais males do que bens”. Isso contradiz diretamente a justificativa declarada para a publicação do decreto Traditionis Custodes.
  3. As seções do relatório final da CDF que foram publicadas eram “parciais e incompletas”, no sentido de que não constituíam o relatório completo. Entretanto, isso não significa que a Quarta Seção do Relatório da CDF fosse um relato “parcial e incompleto” daquilo que os bispos disseram.
  4. A relevância de qualquer “documentação adicional” e de “outros relatórios confidenciais” que entraram no “processo de tomada de decisão” depende de se esses documentos demonstram definitivamente que o relatório da Quarta Seção da CDF estava incorreto e não refletia a posição da maioria dos bispos que responderam à pesquisa. Se não demonstrarem isso, o relatório final da CDF se constitui em um relato preciso da consulta aos bispos de 2020 sobre o Summorum Pontificum.
  5. Dada a gravidade da situação em questão e o seu impacto na vida e unidade da Igreja, é ônus, portanto, do porta-voz do Vaticano provar que os “documentos adicionais” e “outros relatórios confidenciais resultantes de consultas adicionais” contradizem totalmente, ou pelo menos comprometem seriamente, o que consta na avaliação geral do relatório da CDF. Em outras palavras, cabe ao porta-voz do Vaticano demonstrar que esses outros documentos comprovam que o relatório da CDF representou incorretamente as respostas dos bispos do mundo ao questionário e que o Papa Francisco, de fato, teve apoio da maior parte dos bispos na emissão da Traditionis Custodes e na revogação do Summorum Pontificum.

Na ausência de tal prova, podemos concluir que “a maioria dos bispos que respondeu ao questionário” de fato declarou que “realizar mudanças legislativas ao Summorum Pontificum causaria mais males do que bens”.

Artigo original em inglês da jornalista Diane Montagna: New Evidence Confirms CDF Report, Erodes Vatican Narrative on Traditional Latin Mass Restrictions.

Artigos Relacionados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *