Filosofia: conceitos e relação com a Teologia

No artigo anterior nós indicamos que daríamos continuidade ao arcabouço histórico da filosofia na idade média, mas achamos por bem chamar essa ala do site à ordem para antes de mais nada, de forma sucinta, conceituar a filosofia e demonstrar sua importância para o estudo da Teologia.

 

Conceitos de Filosofia

A Filosofia ou, mais precisamente, a palavra philosophos significa “amigo da sabedoria”. Essa expressão grega remonta do filósofo e matemático Pitágoras que, humildemente, compreendeu que a sabedoria propriamente dita vem somente de Deus, sendo possível ao máximo ser amigo dela. De qualquer forma, o conceito mais amplo dessa ciência compreende o estudo do saber.

Segundo Aristóteles, no livro Metafísica, ao homem é inato o desejo de buscar o saber, de modo que até mesmo uma criança nas primeiras fases da fala já profere os famosos porquês.

A necessidade de saber gera os conhecimentos empíricos, que são fruto de exercícios espontâneos da inteligência, porém ainda imperfeitos, desenvolvendo-se para os conhecimentos científicos, de característica certa, geral e metódica, construindo verdades que valem para todos os casos, qualquer lugar ou tempo.

Então, a filosofia é a mais elevada expressão da necessidade de saber, tendo dois objetos de análise:

1. Objeto material: a filosofia versa sobre todo o saber ou todo o real, e por preocupar-se com tudo é uma ciência universal;

2. Objeto formal: por outro lado, diante do aspecto anterior, não se pode concluir que a filosofia abarca todas as outras ciências. Pelo aspecto material, a filosofia preocupa-se com todo o real sob o ponto de vista das causas primeiras e princípios supremos.

As causas primeiras são as causas mais elevadas na hierarquia existente entres as causas. Explica-se: a causa de determinado acontecimento possui uma causa anterior, que por sua vez possui também uma causa anterior, e assim sucessivamente. Assim forma-se uma escala hierárquica de causas. A Filosofia filia-se ao entendimento da causa mais elevada nessa escala, ou seja, à causa que se basta em si mesma no limite da razão provável. Um exemplo é o eclipse pela interposição da lua, que é gerado pela interposição pelas leis mecânicas do sistema solar, estas leis pela gravitação, a gravitação, talvez, pela estrutura da matéria, e a matéria por Deus.

Os princípios são mais abrangentes que as causas, sendo conceituados como, nos dizeres de Aristóteles, o ponto de partida do movimento de algo ou o elemento primeiro. Outra conceituação fornecida por muitos escolásticos o destacam como aquilo de onde algo procede, podendo este algo pertencer à realidade, ao movimento ou ao conhecimento. Os chamados princípios primeiros – supremos ou axiomas – vinculam-se, de forma mais específica, ao entendimento da matéria e da forma originárias, do ato e da potência, dos gêneros supremos do ser, dentre outros elementos.

Enfim, a Filosofia pode ser definida como o conhecimento pelas causas primeiras e princípios supremos, cuja procura filia-se à explicação última e definitiva de todo o real.

Pode-se ainda dizer que a filosofia é a ciência do ser, sendo este a essência ou natureza das coisas ou, até mesmo, a própria existência. Ora, a filosofia está, em primeiro plano, ordenada pela existência, pois visa descobrir os aspectos mais gerais e pontos absolutos dela.

Enfim, a filosofia é ciência, e uma das mais elevadas, por ser perfeitamente racional e sistemática, e por possuir um método rigoroso apropriado ao seu objeto formal, de modo, como dito, a explicar de maneira absoluta e definitiva tudo o que é real. É, portanto, a ciência por excelência.

 

A Sabedoria divide-se em duas ordens principais

Reconhecendo-se que toda Sabedoria vem de Deus, constata-se que existem duas ordens no seu estudo, uma natural e outra sobrenatural, havendo, portanto, ao lado do homem duas ciências supremas, àquela que está sob a égide da razão (lumen rationis) e a outra da fé (lumen fidei). A primeira, a filosofia, considera as verdades enquanto são acessíveis à razão e a outra, a teologia, no aspecto das verdades reveladas.

Considerando tais pontos, destaca-se que a filosofia não deixa de ser autônoma, mas é necessariamente inferior à teologia, por somente atingir a Deus de forma indireta. Logo, a luz da fé é certamente mais elevada que a da razão.

Isto não significa que há um conflito entre elas, mas uma imensa convergência, portanto nunca a filosofia deverá contradizer a verdadeira teologia, já que ambas nasceram da mesma Sabedoria.

A teologia, por ser superior, tem poder sobre a filosofia, mas necessariamente a filosofia fornece à teologia o seu instrumento racional, ou seja, presta-lhe o serviço de assegurar todos os instrumentos racionais necessários à constituição da ciência teológica.

Estando a filosofia sempre subordinada à teologia, diz-se que aquela é como uma serva desta – ancilla theologiae. Analogicamente, pode-se dizer que assim como a Virgem Santíssima, serva do Espírito Santo e infinitamente menor que Seu Senhor, foi essencial ao plano da Salvação, assim também é essencial a função da filosofia como serva da Teologia na construção das doutrinas de fé.

São Justino, mártir do século II, rendendo tamanha importância à ciência filosófica, destacou ser a filosofia o que nos conduz a Deus e a Ele nos une, no sentido de que, pelo exercício da razão, a fé torna-se mais forte e robusta, de modo a alcançar “voos mais altos”, ou seja, resultados bem mais satisfatórios.

 

Fontes:

TRATADO DE FILOSOFIA, TOMO I – LÓGICA e COSMOLOGIA, Régis Jolivet.

INICIAÇÃO À FILOSOFIA DE S. TOMÁS DE AQUINO, H. D. Gardeil.

A FILOSOFIA NA IDADE MÉDIA, Etienne Gilson.

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