As três condições para licitude dos Métodos Naturais

Em nosso artigo anterior sobre o tema, tratamos sobre a mentalidade contraceptiva que se oculta sob o abuso do uso dos métodos naturais. Nele dissemos: Não há dúvidas que há alguns cenários em que métodos naturais podem ser admitidos, mas seu uso arbitrário e sem causas graves nunca poderá ser louvado pela Igreja, pois o uso arbitrário desses métodos traz consigo todos os erros e perigos da mentalidade contraceptiva e constituem verdadeiro pecado. Neste artigo, buscaremos expor as condições e princípios que tornam o uso dos métodos naturais como toleráveis e permitidos – jamais louváveis, repetimos – diante da Igreja.

Um truque para frustrar a natureza

Disse Pe. Lavaud a respeito dos métodos naturais: “Não temos como considerar verdadeiramente natural algo que é, de fato, um truque para frustrar a natureza”. De fato, o termo “natural” não pode ser legitimamente aplicado a estes métodos. Os métodos chamados naturais requerem que o casal tenha sua intimidade controlada artificialmente por meio de calendários, gráficos, tabelas e cálculos de modo que sejam esses artifícios, e não o verdadeiro amor e desejo dos cônjuges, os reguladores da vida conjugal.

Um truque para frustrar a natureza. Estas palavras do teólogo dominicano não poderiam ser mais acertadas. Todo método natural utiliza, em última instância, a natureza contra ela mesma. Quando o corpo e o desejo feminino dão sinais de que estão prontos para a concepção, nesse momento se evita o uso do direito conjugal. Quando, por outro lado, mostram que a mulher está fechada à concepção, nesse momento se usa do direito cujo principal objetivo é, no fim das contas, a própria concepção. Pareceria-nos – se não vivêssemos numa época pagã nas palavras de Pio XII – como uma verdadeira auto-sabotagem.

No início do século XX, o médico japonês Kyusaku Ogino desenvolveu um método para estimar os períodos férteis da mulher com base nos ciclos anteriores. Seu objetivo era auxiliar casais com dificuldades de fertilidade a conceberem. Anos depois, um médico católico holandês, Dr. Smulders, desfigurou o método: Se em determinados dias há maior chance de fertilidade, nos demais a chance é menor: foi o nascimento do método rítmico, o primeiro “método” natural. O Dr. Ogino, porém, se opôs energicamente ao uso de seu método para fins contraceptivos.

Talvez para combater a ascensão de métodos artificiais, nota-se como médicos católicos sempre estiveram na vanguarda da criação dos métodos naturais. Além do Dr. Johannes Smulders, encontramos outros inúmeros católicos entre criadores ou colaboradores de métodos contraceptivos naturais, por exemplo: O Dr. Leo Latz, uma das maiores figuras do método rítmico, o Pe. Hillebrand, criador do método de temperatura basal, O Dr. e a Dra. Billings, fundadores do método homônimo e o Dr. John Rock, fundador da Clínica Rítmica Americana para ensinar o método rítmico aos casais católicos. Este último, após difundir métodos naturais entre os católicos, criou a pílula anticoncepcional otimista que a Igreja a aprovaria e terminou por abandonar a Igreja Católica quando da sua condenação na Humanae Vitae, em 1968. Uma consequência extrema, mas natural, da mentalidade contraceptiva.

Não há dúvidas, repetimos, que há casos em que o uso desses métodos é tolerado e permitido pela Igreja. Estes casos estudaremos a seguir. Não temos por objetivo causar escrúpulos em casais que porventura os utilizem por razões legítimas nem condenar os métodos em si, mas sim denunciar o grave erro de muitos que louvam o uso dos métodos naturais como um modo de vida, utilizando-os como se fossem métodos contraceptivos autorizados pela igreja e difundindo-os como grandes presentes de Deus aos casais católicos, através dos quais se permite, como aos mundanos, o prazer conjugal sem suas consequências divinamente ordenadas. Nosso objetivo é denunciar, como o denuncia o moralista Pe. Gerard Rusak, o uso dos métodos naturais sem causa grave como o grande flagelo do matrimônio católico dos nossos dias.

 

Os métodos naturais e o matrimônio católico

Recordemos as palavras de Pio XII em seu discurso às parteiras católicas:

O simples fato de não violarem os esposos a natureza do ato, e de estarem mesmo prontos a aceitar e a educar o filho que, apesar das suas precauções, vier ao mundo, por si só  não bastaria para garantir a retidão das intenções e a moralidade indiscutível desses mesmos motivos.

Em outras palavras: Não basta não violar a natureza do ato conjugal, como fariam os métodos artificiais, para o uso do método ser lícito e moralmente aceitável. O uso do direito matrimonial em dias de infertilidade feminina podem, como são muitas vezes, ser moralmente censuráveis e mesmo constituirem ato pecaminoso se ativamente forem contrários aos fins do Matrimônio.

O mesmo papa, pelo decreto de 30 de março de 1944 repudia “a opinião daqueles que negam que o fim primário do matrimônio é a procriação e a educação da prole e ensinam que os fins secundários não são essencialmente subordinados ao fim primário, sendo paralelos e independentes a ele”. Os fins do matrimônio são, portanto, dois, um primário e indispensável e outro secundário e dependente do primeiro. Destacar a hierarquia desses dois fins é essencial, pois é o ponto mais atacado, sobretudo na nova moral pós-conciliar. É o fim primário a procriação e educação da prole e o fim secundário, subordinado a este, o auxílio mútuo dos cônjuges e o remédio da concupiscência.

À maior parte dos esposos, diferentemente de como foi a Santíssima Virgem e São José, não é o matrimônio orientado para uma perfeita continência, isto é, a privação total do ato conjugal. Por isso diz-nos Pio XII: “O contrato matrimonial, que concede aos esposos o direito de satisfazerem a inclinação da natureza, estabelece-os num estado de vida, o estado conjugal. Ora, aos esposos que fazem uso deste, praticando o ato específico do seu estado, a natureza e o Criador impõem a função de prover à conservação do gênero humano”.  Verdadeiramente, o matrimônio dá certos direitos, mas apenas na medida em que também impõe deveres muito precisos, o primeiro deles sendo a procriação e a educação da prole: “Na ordem estabelecida por Deus, o indivíduo e a sociedade, o povo e o Estado, a própria Igreja, dependem, para a sua existência, do matrimônio fecundo“. Filhos não são, portanto, obstáculos a se evitar, nem meros acidentes, muito menos adições ao matrimônio ao qual tenham os esposos direito de abrir mão. Os filhos são, ao contrário, o fim primário e principal do matrimônio e por isso “usar constantemente do direito [de ter relações conjugais nos períodos de infertilidade natural], lícita apenas dentro de seus limites, e, por outra parte, subtrair-se sempre e deliberadamente, sem grave motivo, ao seu dever principal, [isto é, jamais ter relações conjugais em dias férteis com o fim de evitar filhos sem causa grave]  seria um pecado contra o próprio sentido da vida conjugal.

 

As condições que tornam legítimo o uso dos métodos naturais

Do que foi dito, resta claro que os métodos naturais não podem ser usados indiscriminadamente. Para serem usados de maneira lícita, há três condições que devem ser cumpridas simultaneamente:

  1. O motivo para o seu uso deve ser grave e moralmente proporcional
  2. A causa deve cair em uma das quatro indicações aceitas: médica, eugênica, econômica ou social
  3. Deve ser mutuamente acordada e possível, sem risco de pecado, a ambos os esposos

Vejamos cada uma dessas condições com seus princípios.

 

1. O motivo deve ser realmente grave e moralmente legítimo

Pio XII em suas alocações fala constantemente de “motivos moralmente suficientes e certos”, “graves motivos”, “sérias razões”, etc. Claramente, os métodos naturais não podem ser usados por quaisquer motivos. E, mais do que isso – e aqui está o principal erro dos católicos que tomam os métodos naturais como um estilo de vida – o motivo deve ser independente da boa-vontade dos esposos, segundo três princípios:

  • O motivo não pode ser por culpa dos esposos
    Os esposos devem fazer tudo dentro de suas possibilidades para cumprir em seu casamento os fins aos quais se ordena o matrimônio, o motivo, então, tem que estar fora das possibilidades de resolução do casal.
  • O motivo não pode ser uma escolha livre dos esposos
    Aqueles que se casam são obrigados a aceitar os deveres de seu estado sob pena de pecado. Não pode, por isso, o motivo ser uma decisão do casal ou de um dos cônjuges.
  • O motivo não pode ser inseparável da lei nem inerente ao seu cumprimento
    Isto é, não pode o motivo ser algo necessário ou normal no cumprimento do dever de procriação e educação da prole, como os sofrimentos, as privações, os riscos e as dificuldades inerentes a este dever

Para auxiliar a compreensão desses princípios para a validade dos motivos, vejamos exemplos negativos para cada um deles:

  • O motivo não pode ser por culpa dos esposos
    Por exemplo, um marido que não queira trabalhar ou trabalhe mal e por isso não possa sustentar um filho ou uma esposa que, por negligência ou acomodação, não se trata de uma doença tratável que impede ou dificulta a saúde da gestação.
  • O motivo não pode ser uma escolha livre dos esposos
    Por exemplo, um pai que simplesmente não quer mais filhos por comodidade ou conveniência, ou uma mãe que queira focar em sua vida profissional sem ser esta realmente necessária para o sustento da família, apenas como uma “realização pessoal”
  • O motivo não pode ser inseparável da lei nem inerente ao seu cumprimento
    Por exemplo, um casal que não queira ter filhos pelas dificuldades da criação, por não quererem ter “mais uma boca para alimentar”, ou porque dificultaria – sem inviabilizar – o orçamento familiar, por medo de problemas que podem acontecer em qualquer gestação, etc.

Motivos que não satisfaçam estas três condições não são motivos suficientes para a licitude do uso do método natural. Esposos que por motivos que não sejam realmente graves, segundo estes três princípios, utilizem de maneira estável do método natural cometem pecado. Estes motivos, porém, são suficientes e não implicam pecado para a continência perfeita, isto é, para a completa abstenção da vida conjugal, desde que satisfeitas as outras duas condições.

 

2. A causa deve cair em uma das quatro indicações aceitas

Há quatro causas que permitem o uso dos métodos naturais, desde que as outras duas condições sejam também satisfeitas, segundo a moral católica, ecoada na alocução de Pio XII de 1958: A causa médica, a causa eugênica, a causa econômica e a causa social. Todas as causas podem ser temporais ou perpétuas. No caso de serem temporais, assim que deixam de existir, perde-se a moralidade do uso dos métodos naturais.

Causa Médica

A causa médica é um diagnóstico médico legítimo que indique grave perigo para a saúde ou vida da mãe no caso de uma nova gestação, seja de um ponto de vista científico ou moral. Nesse caso, a obrigação de gerar filhos deixa de existir, pois a mulher não é obrigada, pelo contrato matrimonial, a se expor a perigos e danos que não são ordinariamente parte da maternidade1.

Um médico pode aconselhar um casal a não ter (mais) filhos em alguns cenários, por exemplo:

  • A esposa com um sério comprometimento físico à qual uma nova gravidez tem alto risco de causar sua morte ou uma grave sequela;
  • A esposa com histórico de complicações em gestações à qual outra gestação tem alta possibilidade de ser fatal;
  • A esposa portadora de uma doença incurável, que possivelmente morreria pouco depois do nascimento do seu filho;
  • A esposa se recuperando de uma cirurgia grave que não teria capacidade de carregar e cuidar da criança;
  • O marido com uma doença grave que não teria condições de sustentar o filho, etc.

Os moralistas, porém, dão-nos algumas palavras de alerta:

É importante, no entanto, não aceitar o julgamento de apenas um médico como um infalível decreto contrário a uma nova gestação: Este médico pode estar errado. Quanto melhor o médico, menos ele estará inclinado a atribuir infalibilidade a suas observações. Como qualquer um, ele pode ser favorável às “famílias pequenas” e rapidamente converter os pais a este modo de vida. O melhor é procurar, sempre, uma segunda opinião, preferencialmente de um médico católico confiável em sua ciência e em sua fé. 2

 

Causa Eugênica

A causa eugênica acontece quando se tem quase absoluta certeza que a gravidez trará ao mundo uma criança fisicamente ou psicologicamente deformada. Nesses casos, a obrigação à procriação cessa. Dizem, porém, os moralistas: “Quanto ao bem pessoal da criança, mesmo em caso de deformidades, tendo sido dito que a obrigação cessa, vale lembrar: é melhor existir que não existir3.

Exemplos de causas eugênicas:

  • Alto histórico de abortos espontâneos;
  • Doença hereditária grave que tenha alta chance de passar para a criança;
  • O casal que tem falha genética grave que afaste a esperança de filhos sadios, etc.

Já que a existência de todo ser humano, uma vez concebido, é sagrada, o aborto é sempre um crime injustificável, mesmo quando o feto é deformado.

 

Causa Econômica

A causa econômica é uma situação real e concreta que obriga os esposos a perceberem que seus meios econômicos são insuficientes para assumir as despesas que acompanham a chegada de outro filho, seja de forma temporária ou permanente. Nesse caso, a obrigação à procriação cessa, embora a Igreja aconselhe a confiança na Providência de Deus, que não recusa os meios de sobrevivência àqueles que chamou a vida4, seguindo o exemplo generoso da família de S. Bernardette Soubirous, nascida em uma grande família extremamente pobre, ou S. Catarina de Sena, a 23ª filha de uma família católica.

Diz-nos o catecismo do matrimônio:

A obrigação à paternidade não requer de um casal ter tantos filhos quanto seja humanamente possível, como alegam alguns críticos, mas obriga a estarem abertos à receber todos os filhos que Deus enviar enquanto possam educá-los e criá-los de maneira razoável.5

A palavra razoável deve ser bem compreendida, senão é abusada. E, deve-se dizer, a causa econômica é a mais abusada de todas pelos casais que não querem ter mais filhos. Ao dizer “maneira razoável”, poderia-mos dizer: capaz de alimentar, vestir e educar, ainda que de maneira humilde. O conforto familiar que muitos casais usam como justificativa para evitar filhos não é razoável. A impossibilidade de manter divertimentos, viagens, melhores colégios e o nível de vida alto também não. 

Exemplos:

  • Uma família que não tenha onde morar ou dependa da caridade para seu próprio sustento;
  • Uma família com o pai desempregado ou sem emprego estável;
  • Um pai sem qualificação profissional que o permita ter esperança de melhorar de vida;
  • Uma família que já seja incapaz de educar os filhos que tem, etc.

Normalmente, a causa econômica é temporária e os pais devem esforçar-se tanto quanto possível para sair dela. Em nossos tempos de hedonismo e materialismo, é muito fácil convencer-se que “não posso mais ter filhos” por razões econômicas. Por isso, recomenda-se que nunca se admita o uso dos métodos naturais sem o conselho sério de um sacerdote piedoso e de boa doutrina.

 

Causa Social

A causa social comporta graves impedimentos de ordem social, quer sejam temporais, quer sejam duradouros. Tais são, por exemplo:

  • Um casal que vive, sem condições de mudança, em uma casa deveras pequena e humilde, a quem mais uma criança seria um grande problema para todos os seus habitantes;
  • O marido que vai, por um longo tempo, trabalhar em cidade distante da família e não poderia cumprir suas obrigações como pai;
  • Proibição estatal de ter mais filhos sob pena de aborto forçado – como é o caso da China;
  • Tempos de guerra;
  • Catástrofes naturais ou grandes epidemias, etc.

Há três falsas situações atribuídas por muitos à causa social para evitar filhos por métodos naturais que merecem particular atenção por:

  • A superpopulação
    Estes casais afirmam que não querem trazer mais uma criança ao mundo estando o mundo já tão cheio de pessoas, invocando razões econômicas (malthusianismo) ou sociais (neo-malthusianismo) para justificar. A superpopulação é uma completa mentira e alegar esta razão como motivo para métodos naturais constitui pecado.
  • Os tempos modernos
    Estes casais afirmam que os tempos mudaram e que, em nossos dias, é impossível ser aberto aos filhos como manda a moral católica tradicional. Recorrem, por isso, a palavras de autoridades eclesiásticas que concordam com o que dizem – o que, infelizmente, há em abundância e sentem-se tranquilos em consciência de ter um ou dois filhos e utilizarem-se de métodos naturais o resto da vida, mesmo sem nenhuma causa justa, apenas por razões do “espírito dos tempos”. A este, na medida em que são conscientes disso, essa prática constitui pecado contra o matrimônio
  • A crise do mundo contemporâneo
    Alguns, ainda, dizem que por conta da tamanha crise moral e de fé do mundo, seria quase um pecado trazer uma criança à vida, por todos os perigos aos quais ela seria exposta e pela imensa dificuldade de educar cristãmente uma criança nascida em nossos dias. Apesar de sua nobre aparência, diz o Pe. Kelly 6, esta é uma asserção totalmente covarde e ridícula. De fato, é justamente por conta da imensidão das forças malignas que todos os pais católicos estão obrigados a fazer tudo em seu poder para trazer a este mundo e educar bons católicos para militar por Cristo Rei contra os erros modernos, se necessário através do sangue do martírio. Os pais católicos devem tomar coragem e cumprir, tanto quanto puderem, a gloriosa função de formar os soldados cristãos do amanhã.

 

Para resumir as quatro causas, damos eco às palavras do Pe. Ceriani:

A vontade de Deus no domínio da procriação é manifestada aos esposos por todos os eventos de sua vida doméstica, que não escapam aos planos da Divina Providência. […] De acordo como tal situação é traduzida por uma dificuldade séria, como visto, de ordem médica, eugênica ou social, os cônjuges irão reconhecer a vontade de Deus nela, sendo permitida para eles, enquanto durar a situação, a continência periódica [os métodos naturais] ou a continência total [em que os esposos se abstenham totalmente do ato conjugal], ambas de modo compatível com a lei de Deus.

As palavras “de modo compatível com a lei de Deus” constituem a terceira condição, que veremos agora.

 

3. Deve ser mutuamente acordada e possível, sem risco de pecado, a ambos os esposos

Explica-nos o Pe. John Goodwine:

Nenhum parceiro pode insistir na abstinência, seja periódica, seja total, contra um protesto razoável do outro parceiro. A razão para isso é que o matrimônio é, por si mesmo, um contrato. Por esse contrato, entre outras coisas, cada um dos esposos concorda em satisfazer o razoável desejo do outro por relação conjugal. Negar-se, sem causa grave, seria uma grave violação da justiça. Dessa maneira, a prática da continência periódica [ou total] seria lícita apenas se e enquanto os dois esposos mutuamente acordarem entre si.

O segundo requisito [em caso do uso do método natural] é que ambos os parceiros efetivamente sejam capazes de praticar a continência nos chamados dias férteis. Quando um casal tenta restringir o uso do matrimônio aos dias estéreis, podem surgir ocasiões de pecado grave, como o abuso de si mesmo, a troca desordenada de afetos sem fim na relação conjugal que termine em uma polução culpável, a desarmonia familiar e, mesmo, a infidelidade. Esses perigos são especialmente graves aos maridos. 7

 

O uso dos métodos naturais sem as condições satisfeitas constitui pecado?

Se as três condições necessárias não são plenamente satisfeitas, cometeria pecado um casal que utilizasse os métodos naturais? Se sim, seria pecado mortal ou venial? Recorreremos, novamente, ao moralista Pe. Goodwine8:

Se alguma das condições necessárias não estiver presente, o recurso aos métodos naturais constituirá pecado. Em certos casos, pecado mortal.:

  • Se um dos esposos optar pela continência sem o consentimento do outro, recusando-se ao uso do direito conjugal, comete-se pecado mortal contra a justiça em todas as vezes que o cônjuge pede o uso do direito, ainda que implicitamente, e este é negado.
  • Se a um ou aos dois esposos o uso do método natural se torna uma ocasião próxima de pecado contra a castidade, comete-se pecado mortal em todas as vezes que se pratica o ato conjugal.
  • Se o uso do matrimônio é limitado aos dias de infertilidade natural deliberadamente a fim de evitar perpetuamente ou a longo prazo a concepção de uma criança sem motivo suficiente, mas apenas para satisfazer a sensualidade e o egoísmo do casal, isto é, apenas para aproveitarem o prazer conjugal sem seus deveres inerentes, comete-se pecado mortal em todas as vezes que se pratica o ato conjugal.
  • Se, porém, a intenção de evitar a concepção com motivos de satisfazer a sensualidade for apenas temporária, comete-se pecado venial. A maior parte dos moralistas concorda, porém, que por “temporário” não se deve compreender como um período maior que seis meses a um ano.

 

Exigências

O uso dos métodos naturais, mesmo nas condições apresentadas, também tem suas exigências9:

  1. Os cônjuges se obrigam a aceitar os filhos, caso falhem os cálculos;
  2. Em perigo de incontinência, devem atender antes de tudo à própria alma;
  3. Mesmo depois do comum acordo, caso um dos cônjuges requeira o uso do débito conjugal, a obrigação de cedê-lo continua de pé;
  4. Os cônjuges se obrigam à luta espiritual e aos sacrifícios para se conterem nos dias de continência;
  5. Alguns se verão obrigados, mesmo a restringir demonstrações mais íntimas e prolongadas do afeto conjugal. Perfeitamente lícitas, quase sempre necessárias à manutenção do amor conjugal e à mutua sustentação moral que se devem os cônjuges, essas demonstrações alimentam o desejo. Dar-lhes livre curso seria, às vezes, pôr-se em perigo.

 

Conclusão

 

Terminamos com a conclusão magistral dada pelo Pe. Goodwine10:

Há de se evitar uma tendência de limitar a discussão sobre a continência periódica às questões de estrita moralidade, a fim de traçar uma linha entre o que se pode e não se pode fazer sem cometer pecado. Essas discussões, embora às vezes necessárias, perdem de vista o ideal cristão da vida familiar.

Deus instituiu o matrimônio como meio de propagação da espécie humana. Um matrimônio fecundo, por isso, e não um matrimônio estéril ou  mesquinho, é o matrimônio segundo os planos de Deus. Ter filhos é o fim primário do matrimônio. A família, por isso, consiste no pai, na mãe e nos filhos.

Há algo gravemente desordenado em um casal deseja se casar, mas sem querer filhos ou predeterminando o tempo para isso acontecer, ou o limitando o número de filhos que pretendem ter.

Um sacerdote amigo meu assemelha estas pessoas a um jovem que deseja se tornar sacerdote e estipula consigo mesmo que não vai rezar a Missa, administrar os sacramentos, pregar ou realizar seus deveres. Este pobre jovem estará buscando evitar as próprias razões pelas quais existe o sacerdócio. Da mesma maneira é um casal que, em razão suficiente, casa sem interesse de cumprir perfeitamente a própria razão do matrimônio.

Mesmo o casal que tem razões suficientes para praticar os métodos naturais deveriam ser aconselhados a fazer mais do que a sua obrigação, a almejar deliberadamente e conscientemente o ideal cristão do matrimônio, mesmo se não forem obrigados a isso

  1. Courier de Roma, Junho de 1992, pg. 2
  2. The Catholic Marriage Manual, p. 56
  3. Dicionário Moral e canônico, Palazzini
  4. Pio XII na alocução de 20 janeiro de 1958
  5. The Catholic Marriage Manual, p. 57
  6. op. cit
  7. The American Ecclesiastical Review
  8. op. cit, adaptada a apresentação para um formato mais fácil de se compreender
  9. Mons. Negromonte em Noivos e Esposos, pg. 105
  10. op. cit.

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