Os dois erros extremos na relação entre Fé e Ciência

É senso comum entre os inimigos da Igreja e aqueles que, de modo geral, demonstram má vontade para com tudo que diz respeito ao Catolicismo, a tese de que, independente da época considerada, a Igreja foi, é e sempre será inimiga da Ciência e do conhecimento técnico-científico, sendo ela um empecilho ao progresso e ao bem da humanidade. Até entre muitos católicos, a noção de que a Igreja obscureceu o conhecimento científico, mentiu, perseguiu e “martirizou” cientistas importantes no passado é tida como verdade incontestável. Para esses católicos, entretanto, tudo isso se deu em um período em que a Igreja era “outra” e eles se mostram satisfeitos em ser católicos hoje, por entenderem que a Igreja enfrentou um processo bastante benéfico de “atualização” e “progresso doutrinário” ao longo dos séculos.

Ambas as posições são equivocadas, frutos de um movimento histórico que ganhou força com o pensamento iluminista, especialmente em detrimento do legado da Idade Média e da Cristandade. Para os pensadores iluministas e seus seguidores, a época medieval, conforme se verifica na esmagadora maioria dos livros e cursos de História modernos, foi um lastimável período de retrocesso, no qual a Igreja Católica, então instituição dominante no mundo ocidental, oprimiu e censurou muitas mentes “iluminadas”, sufocando o progresso científico, que o senso comum sugere ser inimigo da fé. De fato, nem tudo o que se sucedeu a partir da Idade Média é louvável, porém, é necessária muita honestidade intelectual para reconhecer que a realidade histórica acerca da posição da Igreja sobre a Ciência é bem diferente e que isso não se limita à época medieval. Na realidade, a Igreja não somente é favorável ao conhecimento científico, como foi a principal (senão única) responsável pelo desenvolvimento das ciências em períodos críticos da História.

Conforme será abordado também a seguir, quando se considera e discute a relação entre fé e Ciência, dois erros, considerados radicalismos, devem ser evitados: o cientificismo e o fideísmo.

Cientificismo X Fideísmo

Chama-se cientificismo a abordagem segundo a qual tudo o que existe no Universo, incluindo, naturalmente, o próprio ser humano, pode ser explicado, sem ressalvas, através do método científico. Nessa perspectiva, a Ciência teria primazia para explicar a essência e funcionamento da natureza e só se poderia considerar como verdadeiro aquilo que pudesse ser cientificamente aferido, testado e comprovado. Levando-se em consideração tais premissas, não se pode aceitar como real nenhum fenômeno que não seja “palpável”, e, por isso, não existiria a dimensão sobrenatural. Deus, os milagres e a religião são, assim, para os cientificistas (aos quais também se pode aplicar o termo racionalistas), um delírio, uma mentira bem arquitetada e um atentado contra a verdade.

O cientificismo é uma perspectiva própria dos ateus militantes, que enxergam a religião, com destaque para o Catolicismo, como não apenas um empecilho à Ciência, mas como uma ameaça ao bem comum da sociedade humana e que, por isso, deve ser combatido a qualquer custo. Na verdade, a obstinação e diligência dessas pessoas em denegrir sistematicamente a Igreja Católica, tomando (erroneamente) como arma a Ciência, é tal que o cientificismo bem poderia ser considerado uma “religião”, atentando, inclusive, contra a própria razão que reivindicam.

No outro extremo, encontra-se o fideísmo, que é a tendência exagerada em se considerar a supremacia inconciliável da fé sobre a razão, ignorando-se ou desprezando-se todo conhecimento dito científico. O fideísmo é bastante comum e incentivado entre lideranças e fiéis de diversas denominações protestantes, mas também pode ser encontrado entre católicos que, ainda com reta intenção, assumem uma postura torta e fundamentalista que também é bastante prejudicial à verdade e à própria Igreja.

Os fideístas justificam-se através da premissa de que a razão humana estaria de tal modo corrompida pelo pecado que não seria capaz de alcançar qualquer explicação sobre Deus, o próprio ser humano e o mundo natural que o cerca, senão exclusivamente pela intervenção divina e pela revelação contida nas Sagradas Escrituras, que, nesse âmbito, devem ser lidas e interpretadas sempre de forma literal. Os católicos fideístas, assim, demonstram, inadvertidamente, um grande afastamento da sã doutrina da Igreja, à medida que ignoram que a fé católica baseia-se não apenas das Sagradas Escrituras, mas na Sagrada Tradição e no Sagrado Magistério. Especialmente na segunda e na terceira dessas fontes de fé da Igreja, encontram-se inúmeras referências, direcionamentos e testemunhos de santos que nos precederam, enfatizando importância da razão como faculdade conferida pelo próprio Deus e, portanto, imprescindível para se chegar à verdade.

Diversos posicionamentos intermediários a esses dois extremos são possíveis, porém muitos ainda não são satisfatórios. Certas pessoas, por exemplo, costumam creditar a Deus a explicação e causa de todos os fenômenos que a Ciência não explica (ou que ainda não sabem que explica). Essa ideia de Deus, ao qual se pode chamar o “Deus das lacunas”, na verdade, é bastante perigosa, uma vez que os que assim pensam correm o risco de ter sua fé seriamente abalada, à medida que novas explicações científicas possam sucessivamente diminuir a importância e o papel de Deus, tornando a manutenção da fé bastante difícil. O “Deus das lacunas”, ou seja, o Deus que “explica aquilo que está faltando (lacunas)” não passa de uma caricatura do verdadeiro Deus do Cristianismo, a qual não considera sua onipotência e majestade, buscando razões para crer apenas naquilo que pode ser percebido pelos sentidos.

Na realidade, o ponto de equilíbrio entre fé e Ciência consiste em compreender que a verdade baseia-se na consideração de elementos naturais e sobrenaturais, sendo, portanto, incompleta qualquer abordagem que exclua um ou outro elemento. Ao verdadeiro católico, cabe entender que a fé é explicada pela Igreja e que o mundo natural é explicado pela Ciência, assumida como produto da razão da qual Deus dotou todo ser humano. É preciso ter bem claro que essa perspectiva, tida pela Igreja como lógica e conciliadora, também é alvo de ataques dos ateus militantes, que pejorativamente denominam os que assim pensam como “acomodacionistas”: aqueles que se acomodam com falsos argumentos conciliatórios, uma vez que tal conciliação seria intelectualmente impossível, já que a suposta verdade que o Catolicismo apresenta seria invariavelmente fantasiosa. Perseverança, profunda vida de oração e de estudos são importantes ao bom católico para que saiba fazer frente também a esse tipo de acusação.

Por um Congregado Mariano

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