S. João de Brito, Mártir

Nascimento

01/03/1647, Lisboa, Portugal.

Morte

04/02/1693, Oriur, Índia.

Beatificação

1853, pelo Papa Pio IX

Canonização

1947, pelo papa Pio XII

Festa Litúrgica

04 de Fevereiro

Onde Foi Congregado

Na corte do Rei de Portugal, Dom João IV, em Lisboa.

Portugal viveu anos de glória no período das grandes navegações, o espírito lusitano mostrava já o ardor apostólico que tinha, ao providenciar longas e perigosíssimas viagens, sempre com padres e religiosos a bordo, para terras distantes tendo como principal fim a expansão da Santa Fé. Entretanto, em 1580 o rei de Portugal Dom Sebastião morreu na batalha contra os mouros no Marrocos sem deixar descendência. Com o impasse da sucessão, acabou por ocorrer a união ibérica de Portugal com o reino de Espanha, situação essa que perdurou por 60 anos.

Coube ao Duque de Bragança liderar o movimento pela restauração da soberania de Portugal, sendo coroado rei após o sucesso nas disputas com o reino de Espanha. Tornou-se, então, Dom João IV de Portugal, iniciando a dinastia de Bragança. E Dom João tinha não apenas virtudes naturais, mas também ardente fé católica: consagrou Portugal à Imaculada Conceição de Nossa Senhora1 e foi ele mesmo congregado mariano, vindo a fundar uma Congregação Mariana em seu palácio, congregação essa que tinha o próprio rei como presidente. Ali Dom João IV reunia os jovens da corte e preparava algumas vezes ele mesmo a aula aos congregados. Esta congregação teve a honra de ter um rei, mas ainda mais, teve a honra de ter um santo: São João de Brito.

Infância e Vocação

De família nobre, o avô morreu na batalha de Alcácer-Quibir e o tio lutou na batalha de Ameixal, o pai de S. João de Brito, Salvador de Brito, foi nomeado governador geral do Brasil por Dom João IV, vindo a morrer quando o santo ainda tinha cerca de dois anos. A educação da criança ficou a cargo da mãe, dona Brites Pereira, que cultivava firmemente a fé católica, ensinando-a aos filhos. S. João de Brito desde pequeno demonstrava piedade e devoção, era afeito aos sacrifícios e penitências, motivo pelo qual foi apelidado de pequeno mártir. Ainda muito jovem foi nomeado pajem do filho de D. João IV, o pequeno infante D. Pedro, que viria ser rei de Portugal.

Quando tinha por volta de 14 anos, S. João de Brito cai gravemente doente, a mãe faz uma promessa a S. Francisco Xavier e consegue a cura do filho. Para realização da promessa, o jovem lisboeta usa por um ano o hábito jesuíta, o que levou os amigos a apelidarem-no de apostolinho. E uma vez usando o hábito para cumprir a promessa, foi difícil retirá-lo. S. João tem um ardente desejo de ingressar nas fileiras jesuítas e ir para o Oriente converter os pagãos, mas a mãe faz-lhe oposição, temendo pela saúde frágil do filho. O santo, então, escreve uma carta pedindo a permissão da mãe:

Minha Mãe e minha Senhora, é chegado o tempo de eu deixar a Vossa Mercê por buscar a Cristo, pois Cristo me amou tanto que deixou seu Pai para me buscar a mim. Conheci o que o mundo dava, quando experimentei que no rigor da enfermidade mortal só me alcançou saúde a intercessão de S. Francisco Xavier: desenganei-me do que o mundo era, quando no seu conhecimento vi o pouco que podia... Falta-me a santa e maternal benção de Vossa Mercê, que entendo me não há-de negar. Se alguma pena levo é precisamente considerar a com que Vossa Mercê fica, vendo-me afastado da sua companhia. Mas Deus, cujo império me obriga, lhe dará tão fervorosamente auxílios da sua graça, que na assistência dos seus favores não ache menos a minha.

Após uma carta como esta, a mãe não poderia negar-lhe a vocação: S. João de Brito ingressa no noviciado jesuíta e estuda por dois anos a vida e regras jesuítas. Após o noviciado, vai para Évora onde estuda filosofia, mas por conta da saúde, muda-se para Coimbra para continuar os estudos. Apesar disso, ainda não estava cumprido o grande desejo do jovem santo: queria ainda ir para as terras de missões e levar a salvação de Nosso Senhor aos povos esquecidos no paganismo. Escreve, então, ao seu superior pedindo para ser nomeado para as missões na Ásia:

Tendo alcançado a saúde por um voto feito a S. Francisco Xavier, fui recebido na Companhia de Jesus; mas tanta é a bondade do Santo que, como arrependido da exiguidade do primeiro benefício, intenta emendá-lo com outro maior, o qual consiste em excitar-me a empreender a viagem para a Índia, não vá suceder que a saúde por ele restituída, seja consagrada a outro que não ele. Fui dissimulando estes desejos, pois ainda não tinha iniciado o estudo da Filosofia; agora, porém, embora não a tenha terminado, julgo estar suficientemente adiantado, segundo opinião prudente, para trabalhar naquelas terras. Que falta pois? Suplico e conjuro a Vossa Paternidade com a máxima instância que me dê licença e liberdade para corresponder ao chamamento de Xavier; creio, na verdade, que a intenção do meu queridíssimo Santo é, assim como me restituiu ao corpo a saúde perdida, abrir-me agora este caminho para a eterna felicidade. Pelas chagas de Cristo, pois, pelos méritos do Santíssimo Xavier, pela maior glória de Deus (cujos aumentos V. Paternidade anseia mais que tudo) rogo uma e outra vez me conceda licença para partir para o meio dos Índios. E para que não suceda, como algumas vezes costuma suceder, vir alguém imiscuir-se aqui em Portugal neste negócio, que V. P., segundo espero, resolverá de modo favorável, peço a V. P., cumule um favor com outro favor, isto é, que a carta em que me conceda a desejada licença, ma envie só a mim, de modo que nada deste assunto tenha de tratar com o P. Provincial. Na benção de Vossa Paternidade muito me encomendo.

Indigno filho em Cristo,
João de Brito.

Ocorre que nessa época estava em Portugal o superior das Missões de Madurai, na Índia, solicitando mais missionários para o apostolado naquele país. S. João de Brito consegue a aprovação de seu superior e influenciado pelo Governador das Missões em Madurai, parte para este lugar, depois de terminar os estudos de teologia e ser ordenado sacerdote. Parte de Lisboa para a Índia no dia 15 de março de 1673 com 27 jesuítas a bordo, em viagem de 6 meses que levou a cabo a vida de seis dos religiosos, tal era a dureza da viagem.

Missões na Índia

Chegou na Índia no dia 14 de setembro do mesmo ano, realizou estudos em Goa antes de ir para o interior do país. Neste período, aplicava-se a duras penitências, dormia no chão, fazia jejuns e evitava de comer carne por penitência. No ano seguinte, segue para Madurai onde inicia as missões naquela região. Ensina o catecismo para o povo que se refugiava nas florestas das guerras entre reinos.

A Índia é um dos países mais antigos, possuía naquela época muitos reinos e milhões de ídolos, além da estrutura social das castas, que dificultava as missões. Entre 1674 e 1679 S. João de Brito realiza ali apostolado e pregações, chega a conquistar os governantes locais e ganhar apoio. Realizou milagres e debates com os sacerdotes das falsas religiões, muitos dos quais se recusavam a debater com o santo.

O São Francisco Xavier de Portugal

Em pouco tempo aprendeu o idioma tamil com um sacerdote jesuíta e convertia muitos através de seus discípulos já convertidos. Curou um jovem indiano de sua enfermidade e extirpou uma praga de lagartos das plantações com água benta. Tão frutuosos apostolados tinham como fonte uma vida interior não menos fervorosa.

Conhecido como o Francisco Xavier de Portugal, S. João de Brito chegou a ministrar os sacramentos para mais de 3 mil pessoas em uma quaresma. Mais tarde, nas florestas de Maravá, precisou ter os braços auxiliados para ministrar o sacramento do batismo para mais de duas mil pessoas no mesmo dia.

Apesar do sucesso do apostolado entre os mais pobres, o contato com pessoas de castas inferiores era mal visto entre as demais castas, o que causava grande dificuldade de aproximação com os brâmanes, que eram os superiores entre as castas. Vendo que se conquistassem os brâmanes, conquistariam o povo, os jesuítas tiveram de reelaborar seu apostolado. Para isso alguns padres tiveram a ideia de se vestirem como brâmanes, para se fazer ouvir por eles, seguindo o conselho de S. Paulo "Fiz-me como fraco para os fracos, para ganhar os fracos. Fiz-me tudo para todos, para por todos os meios chegar a salvar alguns" (I Coríntios IX. 22). Tal método gerou polêmica na época, mas a questão foi levada pelos jesuítas ao Papa, que a aprovou.

Conseguindo a conversão de muitos brâmanes, sua fama já causava grande admiração e furor dos sacerdotes idólatras. Foi perseguido e preso por soldados, mas apenas teve os bens tomados. Em seguida quis rumar para Maravá, lugar onde mais havia martírios, o que levou os brâmanes a reunirem-se para conspirar sua prisão. Foi preso e torturado amarrado em uma árvore por 20 dias, pelos golpes, ficou tão desfigurado que causou grande comoção ao rei e aos sacerdotes. Por isso, o rei decidiu soltá-lo com a promessa de que não mais retornasse à região.

S. João de Brito vestido como brâmane.

Retorno a Portugal

Após ter se recuperado das torturas, S. João logo quis retornar a Maravá, mas foi designado pelos seus superiores a voltar à Europa a fim de tomar parte na conferência dos jesuítas em Roma. Na viagem de volta, passou pelo Brasil, desembarcando em Salvador e seguindo, meses depois, a Lisboa, onde sua fama já o precedia e foi recebido com festa. Em Lisboa incentiva os jovens a irem às Missões na Ásia e cuida dos doentes no hospital. O infante D. Pedro, seu amigo de infância e príncipe herdeiro não escondeu a alegria e admiração ao reencontrar o amigo:

Regozijo-me por te ver tão diligente no serviço do teu novo Senhor; ele há-de com certeza recompensar-te com mais largueza do que podias esperar de mim, se houvesses continuado ao meu serviço

Retorno à Índia e Martírio

A S. João de Brito oferecem o cargo de superior das missões, mas seu desejo mesmo era retornar à Índia. De fato, retorna no ano de 1690 e continua os apostolados no reino de Maravá. Um dos príncipes do reino se interessa pelo catolicismo e passa a ter aula de catecismo com o santo, mas logo cai doente. Para ele é lido o Evangelho de S. João e logo recobra a saúde, desejando finalmente ser batizado. Entretanto, o rei era polígamo e para ser batizado, decide permanecer com a primeira das esposas, rechaçando as demais, mas prometendo-lhes auxílio material. Uma das esposas rechaçadas era prima do rei e o denuncia às autoridades. S. João é preso novamente e passa por novas torturas.

Da cadeia, S. João escreve uma carta ao seu superior, cujo texto se torna famoso: 'quando a culpa é virtude, o padecer é glória'. No dia 4 de fevereiro, quarta-feira de cinzas, veio a condenação. S. João de Brito é decapitado e tem o corpo dilacerado, tendo tronco e cabeça colocados em postes. Seus companheiros recolhem seus objetos pessoais e corpo para sepultamento.

A notícia do martírio de S. João de Brito foi recebida em Portugal com grande alegria: o país agora tinha um santo a quem poderiam recorrer. A mãe de S. João, dona Brites, ainda viva, foi recebida com alegria na corte em Lisboa pelo rei D. Pedro II, o coração da mãe do mártir exultava de alegria pela graça que Deus lhes havia concedido, tal era a fé do povo.

Após seu martírio, muitos outros milagres foram relatados pela intercessão do santo português. Sua beatificação se deu pelo Papa Pio IX em 21 de agosto de 1853, sua canonização foi feita sob Pio XII, no dia 22 de junho de 1947. Sua festa litúrgica é o dia do martírio, 4 de fevereiro.

  1. Isso se deu séculos antes do dogma, que foi proclamado apenas em 1854. Por esta consagração do reino de Portugal a Nossa Senhora, os reis portugueses eram sempre representados nas pinturas sem coroa, uma vez que o reino pertencia à Virgem Imaculada

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